Não sei quantos seremos, mas que importa?!
Um só que fosse, e já valia a pena
Aqui, no mundo,alguém que se condena
A não ser conivente
Na farsa do presente
… Posta em cena!
Não podemos mudar a hora da chegada,
Nem talvez a mais certa,
A da partida.
Mas podemos fazer a descoberta
Do que presta
E não presta
Nesta vida.
E o que não presta é isto, esta mentira
Quotidiana.
Esta comédia desumana
E triste,
Que cobre de soturna maldição
A própria indignação
Que lhe resiste.
Miguel Torga
Dada a relevância do comentário da Fátima, achei por bem acrescentá-lo ao poema do Torga. Obrigada Fátima.
“O poema [“Plateia”]de Miguel Torga, que transcreves, foi escrito em 1962 e vem inserido na obra “Câmara Ardente”. Sublinho a data porque, ao tempo, e apesar da idade, Salazar vicejava, mandava como queria e exigia respeitinho. O respeitinho com que tinha ordenado, pouco antes, que os (escassos) soldados da Índia portuguesa combatessem até ao último homem; o respeitinho que mandou os nossos jovens “depressa e em força para Angola”, que é como quem diz, para a África portuguesa, e a mim me levaria três irmãos para lá. Por cá, quem não conseguia escapulir-se a salto para França apodrecia nas cadeias se tinha ideias de liberdade, ou condenava-se a uma vida soturna se nem sabia o que era isso da liberdade. É nesse contexto, e só nele, que leio os magníficos versos de Torga.
Torga era um pessimista, mas não um derrotista. Mais adiante, na mesma obra, inicia o poema “Comunicado” com os seguintes versos:
“Falta um combate ainda, o decisivo,
Ganhei quantos perdi, porque resisto.
Mesmo cansado e mutilado, existo,
Num vitalismo cósmico e ostensivo.
Filho da Terra, minha mãe amada,
É ela que levanta o lutador caído.
Anteu anão,
Toco-lhe o coração,
E ergo-me do chão
Fortalecido. (…)”
É, pois, esta recusa da derrota, que é preciso erguer como bandeira.”
Fátima Stoker
Fátima Pereira Stocker
/ 13/11/2011Bom dia, Eduarda!
Confesso que andava um pouco apreensiva…
O poema [“Plateia”]de Miguel Torga, que transcreves, foi escrito em 1962 e vem inserido na obra “Câmara Ardente”. Sublinho a data porque, ao tempo, e apesar da idade, Salazar vicejava, mandava como queria e exigia respeitinho. O respeitinho com que tinha ordenado, pouco antes, que os (escassos) soldados da Índia portuguesa combatessem até ao último homem; o respeitinho que mandou os nossos jovens “depressa e em força para Angola”, que é como quem diz, para a África portuguesa, e a mim me levaria três irmãos para lá. Por cá, quem não conseguia escapulir-se a salto para França apodrecia nas cadeias se tinha ideias de liberdade, ou condenava-se a uma vida soturna se nem sabia o que era isso da liberdade. É nesse contexto, e só nele, que leio os magníficos versos de Torga.
Torga era um pessimista, mas não um derrotista. Mais adiante, na mesma obra, inicia o poema “Comunicado” com os seguintes versos:
“Falta um combate ainda, o decisivo,
Ganhei quantos perdi, porque resisto.
Mesmo cansado e mutilado, existo,
Num vitalismo cósmico e ostensivo.
Filho da Terra, minha mãe amada,
É ela que levanta o lutador caído.
Anteu anão,
Toco-lhe o coração,
E ergo-me do chão
Fortalecido. (…)”
É, pois, esta recusa da derrota, que é preciso erguer como bandeira.
Um grande beijo
deolinda gonçalves
/ 13/11/2011Não te ausentes. Fazes falta e muita…
Beijos
Deolinda
FerNAnda - Ná
/ 14/11/2011Uma escolha fantástica, do meu amado Torga.
“Vale sempre a pena, mesmo que seja só um a não ser conivente com a farsa”
Mais e mais se indignarão.
Beijinhos
Ná
Janita
/ 14/11/2011Olá Eduarda!
Estou muito contente por a ver de volta e logo com um poema desse grande Português que tanto aprecio. Médico, dramaturgo, poeta e…transmontano! Só podia ser homem de fibra.
Se ainda cá estivesse sentir-se-ia indignado com toda esta comédia humana que atravessamos.
Parabéns pela escolha.
Beijinhos.
Fátima Pereira Stocker
/ 19/11/2011Eduarda
Obrigada eu!
Beijos
António Brás Pereira
/ 21/11/2011Passei para lhe dizer: olá! Gostei do poema… a escolha é também oportuna.~
Adoro ler os comentários de gente culta… particular carinho e apreço por um…. abraço
Ana Martins
/ 24/11/2011Eduarda, boa noite!
Mais oportuno, este poema não podia ser. Embora ele tenha sido escrito em 1962 e noutro contexto, ele adapta-se com perfeição aos nossos dias.
Indignemo-nos então!!!
FerNAnda - Ná
/ 30/11/2011Amiga Eduarda!
Vim saber se ti. Está tudo bem?
Assim espero.
Beijo
Ná
FerNAnda - Ná
/ 22/12/2011Minha querida amiga Eduarda,
Com votos de feliz natal, deixo-te o poema da árvore de natal diferente.
Beijinhos
Ná
“Sou uma árvore de Natal diferente”
Um dia senti,
Que a terra ardia.
Pensei, ser eu
Que estava febril,
Delirante,
Ou tinha mesmo acordado
Atordoada,
De uma noite mal dormida.
O tempo era de Verão,
O vento que soprava
E a gente que passava.
Grande era o alarido
Que num instante
Virou clamor e fundiu o espanto
Em pranto de dor.
Não estava febril, afinal,
Nem mesmo mal acordada.
Tudo ardia em meu redor
Ao som de gemidos e estalidos
Em tom de sinfonia gritada,
E logo em cinzas eu via
A minha terra,
A minha gente,
O meu adro
E o meu terreiro…
Holocausto em nome de nada.
A dor foi passando
Como a água do ribeiro
Ao encontro da outra margem.
Do meu chão,
Erva verde, frágil e mansa
Foi crescendo,
Relembrando a cada instante
A minha solidão,
A negrura,
Que em tom de amargura
Se havia instalado
Em todo o canto de mim.
Sem ramos, nem folhas,
Sem filhos, nem amigos
Desistia da vida,
Mesmo,
Que o vento me açoitasse
E as lágrimas teimassem
Em saltar porta fora.
O tempo foi passando
Estirada naquele chão,
Espreitava o dia acontecer,
No desejo de me arrastar
Para além do mar.
Um dia,
Um outro dia…
O chão estremeceu.
Do céu, uma fresta de luz
Incandesceu,
E não sei mesmo
O que me aconteceu.
Senti mãos,
Escutei vozes,
E fiz viagem até esta paragem.
E aqui estou eu!
Nesta sala iluminada,
Neste sítio ajeitado no abraço,
Neste canto todo feito de ternura.
Continuo feia e queimada,
Ressequida e enquistada,
Não mo lembrem, …sei bem.
Mesmo sem ramos, nem folhas,
Mesmo tendo perdido o vigor
E a robustez doutros tempos,
Neste espaço tão mimado
E com laços brancos enfeitada,
Sinto-me noiva, amante
Deste tempo de Natal.
Saibam de mim!
Escutem a voz do meu coração,
Olhem bem em meu redor…
E mesmo que a noite seja fria
Não há maior alegria
Do que aquela
Que a minha alma canta.
De braços queimados,
E toda vestida de branco,
Oh gente de Campos,
Oh gente desta terra
Bem-haja!
Obrigada.
Natal de 2011
Poema de Maria José Areal”